O espaço de divulgação da Comissão de Reeducação Ideológica e Propaganda d'O Partido

sábado, agosto 26, 2006

Pequeno Manual do Pequeno Camarada (pMpC)

Capítulo (-) I

NOTA EDITORIAL: O ˝pequeno Manual do pequeno Camarada˝, apesar de obra elaborada e aprovada pela Comissao para a Reeducacao Ideológica e Propaganda, é passivel de múltiplas interpretacoes por parte dos pequenos camaradas, especialmente aqueles na idade-da-inocencia-de-oiro. Por estas e por outras, o CRIP recomenda a sua leitura sob supervisao de um Camarada de reconhecida lucidez burocrática e capacidade cognitiva. O mesmo já nao se aplica aos Camaradas que optam por ler a obra para, de forma nostálgica, revisitar o pequeno Camarada que ha em cada um de nós.

Título: Camaradagem na Porcalhota.

Índole: Capítulo Negativista (-I)

Público-alvo: Maiores de 6 anos.

Observacoes: O segmento literário que se segue encontra-se contra-indicado aos pequenos camaradas leitores com historial de perturbacoes do sono (episódicos ou crónicos). Em caso de duvida, ler sob a supervisao de um camarada com treino em assistencia psiquiátrica.

...

Era uma vez um Rei.

ATENCAO AOS APOIANTES DE REGIMES MONÁRQUICOS, PEQUENOS CAMARADAS!

Este Rei vivia no seu Reino e governava só, num regime absolutista.

CUIDADOS REDOBRADOS ESPECIALMENTE REGIMES ABSOLUTISTAS!!!

Era um monarca bom justo e bonito. Claro que o Rei tinha muitas outras qualidades, mas eram estas tres que lhe enchiam o orgulho. Tratava bem os seus subditos (quem quer que fossem e onde quer que estivessem), com bondade e justica. E, bolas, era bem jeitoso.

Todos os dias, o Rei dava grandes voltas no seu Reino e apreciava todos os pormenores do imenso espaco que governava. Esta era uma tarefa diária mas nada enfadonha, pelo contrário – era um verdadeiro prazer verificar se estava tudo em ordem e rectificar o que necessitasse de rectificacao. Mesmo após tamanha actividade, o Rei nao se rendia aos dúbios prazeres do marasmo e retomava ao seu treino cultural. Ora lia textos, ora os escrevia para rele-los mais tarde. Passava-se o mesmo com as suas canconetas, embora neste caso o prazer fosse simultaneo…

PEQUENOS CAMARADAS, SÓ O SOLIPCISMO É DESCULPÁVEL (DESDE QUE DEVIDAMENTE COMPROVADO POR PROFISSIONAIS DE SAÚDE), NUNCA O VIL EGOCENTRISMO!!!

Culto, bondoso, justo e bonito. Era, pois, por isso que se interrogava frequentemente qual a causa de nunca ter encontrado nas redondezas uma nobre dama disposta a auxiliá-lo nas suas árduas tarefas diárias. E claro!, alguém que o respeitasse, entendesse e venerasse q.b. Mas se mesmo ele nao possuia todas as respostas, porque se havia de preocupar?

Era, portanto, uma vida de rei. Nao fosse pelo reino vizinho, aliás, seria uma vida de perfeita paz interior. Mas o Rei nao conseguia deixar de se fascinar pelo estranho comportamento dos habitantes vizinhos. Comportavam-se de forma completamente organizada sem que, no entanto, se conseguisse distinguir com clareza qual o seu Rei, quem mandava! Sentia por vezes um estranho sentimento de curiosidade e excitacao ao fantasiar como seria pertencer aquele reino e, melhor, reinar todo aquele territorio e as suas gentes. Era uma sensacao tao incontrolável e contagiante que o Rei mantinha todas as suas janelas cobertas com tapecaria persa, para evitar assistir aquele espectáculo todos os dias.

Houve uma noite, porém, que o Rei passou a magicar uma estratégia para visitar o reino vizinho e conhecer quem o governava. Pensou imenso, inventou diversas estratégias mas, apesar do seu rigoroso regime de treino teórico, nada se assemelhava a um bom plano. E, um pouco desiludido com o desperdício de serao, foi-se deitar.

Era o seu sonho favorito, que sorte! O Rei passeava pelo seu reino, revia mentalmente a sua coroacao vezes sem conta, olhava-se no espelho e pasmava-se com a sua beleza. Sorria, acenava por vezes `as vozes que o aclamavam. Vestia a sua armadura da invencibilidade suprema e, fazendo-se acompanhar da sua pena e da sua lira de sete cordas, partia para a descoberta (e conquista cultural) do estranho reino vizinho!

Mas no estranho reino vizinho as coisas era diferentes. Nunca ninguém o reconhecia, apesar da elevada frequencia das suas visitas, o que lhe provocava alguma frustracao. As pessoas nao paravam para ouvir os seus versos, nem para dancar ao som das suas rimas. Tambem os edificios comportavam-se do forma estranha, esquivando-se ao seu toque, exalando vapor com cheiro de pasta de papel que abafava a sua refinada fragancia a flores-uvas hispanicas. Até as janelas e os vidros se recusavam a reflectir as suas belas cores, emitindo uma calma claridade acinzentada. E, como se isso nao bastasse, pequenos lemures insistiam em afixar numerosos cartazes nas suas imediacoes, contendo estranhos conteúdos como ˝Cuidado, que é Rei!˝ ou ˝Nao reinar a desgraca alheia!˝. Nem estes respondiam quando o Rei os interpelava. O Rei achava tudo isto muito pouco hospitaleiro e ligeiramente ofensivo, pelo que acabava sempre por regressar a casa muito antes até do recolher obrigatório imposto por si próprio (remanescencias da sua educacao britanica).

A DEFESA DA BUROCRACIA IMPOE-SE PERANTE TODOS OS SEUS INIMIGOS, PEQUENOS CAMARADAS! MESMO PERANTE AQUELES QUE NAO SE RECONHECEM COMO TAL!!!

Alvorada. O Rei tinha falhado. Outra vez. Mesmo depois de tanto planeamento, a missao de se misturar com os seus pictorescos vizinhos, de lhes descobrir as motivacoes e de, talvez, governá-los tinha-se frustrado. Apesar de tudo, o Rei nao controlava os seus sonhos. Entao, ainda cego pelo orgulho e manchado pela vergonha, o Rei levantou-se e dirigiu-se `a sua janela, para contemplar o que nunca seria seu.

POR TODAS AS RAZOES IMPLÍCITAS, O REI NUNCA SERÁ UM BOM CAMARADA!